Os líderes dos países do G20 aprovaram nesta segunda-feira, dia 18, a declaração final da cúpula das 20 maiores economias do mundo, realizada no Rio de Janeiro. O texto inclui temas que eram primordiais para o governo brasileiro, que ocupa a Presidência rotativa do grupo, e trata dos conflitos no Oriente Médio e na Ucrânia.
A declaração menciona os três temas prioritários do encontro – combate à fome e à pobreza, sustentabilidade e mudanças climáticas e reforma da governança global – e várias outras questões, como proposta de a taxação dos super-ricos e a inteligência artificial.
O Brasil não cedeu às pressões da Argentina e manteve no texto o apoio a temas como a igualdade de gênero e a taxação de bilionários. Após ameaçar o consenso em torno da declaração final da cúpula, o presidente argentino, Javier Milei, confirmou que assinaria o documento, embora tenha deixado clara sua oposição a alguns trechos.
Em nota, o gabinete do líder argentino destacou que é chegada a hora de “reconhecer que o atual sistema de cooperação internacional está em crise, porque há muito está em dissonância com seu propósito original”, que, para Milei, seria salvaguardar os direitos básicos dos cidadãos.
A nota da Presidência argentina critica “a limitação da liberdade de expressão nas redes” e “a noção de que uma maior intervenção estatal é uma forma de lutar contra a fome”.
Conflitos
A declaração do G20 destaca as consequências humanitárias dos conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza e condena o uso da força contra a soberania dos Estados.
O texto menciona a crise humanitária em Gaza e no Líbano e ressalta o sofrimento humano e os impactos adversos das guerras e conflitos em todo o mundo. Os líderes pedem soluções diplomáticas e de paz e reafirmam o apoio a uma solução de dois Estados para o conflito entre Israel e o grupo islamista Hamas.
“Afirmamos que todas as partes devem cumprir suas obrigações sob o direito internacional, incluindo o humanitário e de direitos humanos, condenando ataques contra civis e infraestrutura”, diz a declaração. A referência às infraestruturas surgiu após os violentos ataques russos à rede de energia na Ucrânia, que nos últimos dias cortou o abastecimento de boa parte de país.
Os países do G7 (as sete maiores nações industrializadas), defendiam que o texto trouxesse uma condenação à Rússia por sua guerra de agressão na Ucrânia. Por sua vez, o Brasil e outras nações emergentes exigiam que a declaração mencionasse a situação dramática em Gaza e no Líbano, em meio ao conflito entre Israel a os grupos islamistas Hamas e Hezbollah.
Ao final, a posição dos países emergentes prevaleceu e a situação do Oriente Médio foi mencionada com maior destaque.
Os líderes ressaltaram ainda a necessidade urgente de aumentar o acesso da assistência humanitária às zonas de conflito. Israel, porém, não é mencionado como sendo o país responsável pela crise. É possível que a menção a Tel Aviv pudesse resultar em um veto dos Estados Unidos à declaração.
O documento menciona também a guerra da Ucrânia e os impactos desse conflito nas cadeias de abastecimento e na estabilidade financeira global, embora não faça nenhuma menção à Rússia.
Desigualdade e Sustentabilidade
O G20 reafirmou o compromisso com a Agenda 2030, o documento assinado por 193 países em 2015 que visa alcançar a igualdade de gênero e empoderar meninas e mulheres, promover o crescimento sustentável e tomar medidas urgentes para combater a mudança climática.
A declaração afirma que apenas 17% das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estão no rumo correto. O texto destaca ainda que as desigualdades entre os países e as regiões são fatores que agravam os desafios globais.
Clima
O documento afirma que as nações compreendem e reconhecem a urgência e a gravidade das mudanças climáticas e descreve as ações a serem adotadas pelos países para reduzir as emissões dos gases causadores do efeito estufa. O G20 também reforça o apoio às metas estabelecidas no Acordo de Paris.
“Reiteramos nossa determinação de permanecer unidos nos esforços para atingir o propósito e os objetivos de longo prazo do Acordo”, diz o texto. “Reafirmamos a meta de temperatura do Acordo de Paris de limitar o aumento da temperatura média global para bem abaixo de 2º C acima dos níveis pré-industriais e de empreender esforços para limitar o aumento a 1,5º C acima dos níveis pré-industriais, reconhecendo que isso reduziria significativamente os riscos e impactos da mudança do clima.”
“O mundo requer não apenas ação urgente, mas também medidas socialmente justas, ambientalmente sustentáveis e economicamente sólidas”, afirmam os líderes na declaração.
O G20 criou a chamada Força Tarefa para Mobilização Global contra as Mudanças Climáticas para reforçar o financiamento climático, especialmente nos países em desenvolvimento.
Combate à Pobreza e à Fome
Em um êxito diplomático para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi lançada no G20 a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.
A Aliança possui 148 membros fundadores, com 82 países dos cinco continentes além da União Europeia, União Africana, 24 organizações internacionais, nove instituições financeiras internacionais e 31 organizações filantrópicas e não governamentais.
A iniciativa visa dar uma dimensão internacional ao combate às desigualdades sociais, exportando políticas de assistência social bem sucedidas – como o Bolsa Família – a outros países, além de permitr que outros países adotem medidas de combate à desigualdade que já deram certo em outras partes do globo.
Inteligência artificial
O texto menciona os desafios gerados pela inteligência artificial e defende o uso das novas tecnologias para fomentar a inclusão social, saúde e educação, com apoio à capacitação digital global.
A declaração menciona a necessidade de uma regulamentação centrada no ser humano, com ética, transparência e responsabilidade, bem como menciona os riscos associados à IA, como a desinformação e os riscos à privacidade,
Reformas na governança global
Outro tema prioritário para o governo brasileiro que acabou sendo incluído na declaração final foi a menção à necessidade uma de reforma no Conselho de Segurança da ONU para melhorar a representatividade de países da África, Ásia, Pacífico, América Latina e Caribe.
Os líderes defenderam o fortalecimento de instituições financeiras multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, de modo a assegurar maior representação para as nações em desenvolvimento.
Taxação de super-ricos
A declaração destaca a importância de taxar de forma eficaz os “indivíduos com patrimônio líquido ultra-alto”, ao mesmo tempo em que defende o respeito à soberania fiscal de cada país. A iniciativa inclui cooperação internacional para troca de boas práticas, combate a práticas fiscais nocivas e criação de mecanismos anti-evasão.
O G20 incentiva a aplicação de sistemas tributários mais progressivos para reduzir desigualdades e financiar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis. Os líderes propõem ainda um debate contínuo sobre o tema em fóruns globais.
Papel centra da OMS
O G20 reitera o papel central da Organização Mundial de Saúde (OMS) no fortalecimento da arquitetura de saúde global e destaca a necessidade de sistemas de saúde resilientes, financiamento sustentável e acesso equitativo a vacinas, diagnósticos e tratamentos, especialmente para doenças negligenciadas.
A declaração sugere a criação de uma Coalizão para Produção Local e Regional, Inovação e Acesso Equitativo para ampliar o acesso a tecnologias de saúde com base na cooperação voluntária.