Receber um diagnóstico de câncer em idade fértil traz, além da preocupação imediata com a saúde, uma questão muitas vezes negligenciada: a incerteza de realizar o sonho da maternidade no futuro. Estudos apresentados durante o congresso Todos Juntos Contra o Câncer (Set/2025) indicam que cerca de 50% dos pacientes em idade reprodutiva desconhecem que a fertilidade pode ser comprometida pelos tratamentos oncológicos, e apenas 15% chegam a receber aconselhamento de um especialista em reprodução humana.
Os tratamentos contra o câncer nas mulheres, como a quimioterapia e a radioterapia, podem afetar diretamente os ovários, reduzindo a reserva de óvulos e comprometendo de forma definitiva a fertilidade. Por isso, o tempo é um fator decisivo. O congelamento de óvulos — quando há decisão de realizá-lo antes do tratamento oncológico — é hoje a técnica mais utilizada para preservar a fertilidade feminina, mas exige até 14 dias de preparação antes do início da terapia. Isso obriga pacientes e equipes médicas a tomarem decisões rapidamente após o diagnóstico, avaliando se é possível adiar o tratamento contra o câncer para realizar os procedimentos para preservação da fertilidade.
Uma alternativa, já disponível em clínicas de fertilidade no Brasil, é o congelamento de tecido ovariano —, um procedimento em que fragmentos do ovário são removidos e congelados antes do tratamento oncológico. Posteriormente, esse tecido pode ser reimplantado, permitindo a restauração da função ovariana e, em alguns casos, até a ocorrência de gestação natural. A técnica amplia as possibilidades de preservação da fertilidade para mulheres em idade reprodutiva, especialmente aquelas que precisam iniciar rapidamente a quimioterapia ou radioterapia.
Além das estratégias de preservação da fertilidade, os próprios avanços no tratamento do câncer também têm contribuído para transformar esse cenário.A evolução da oncologia de precisão tem permitido terapias mais eficazes e menos agressivas, que reduzem os impactos sobre os ovários e ampliam as chances de maternidade após o tratamento. Tecnologias como testes genômicos e painéis de biomarcadores por sequenciamento de nova geração (NGS) ajudam médicos a compreender o perfil molecular de cada tumor e a recomendar terapias mais personalizadas. Com isso, é possível alcançar melhores desfechos clínicos, mais qualidade de vida e novas perspectivas de futuro para as pacientes — inclusive o sonho de ser mãe.
Estudos recentes também reforçam que engravidar após o câncer não apenas é possível, como pode trazer benefícios adicionais à saúde. Pesquisa publicada no Journal of Clinical Oncology mostrou que mulheres que engravidaram após o tratamento de câncer de mama apresentaram maior tempo de sobrevida em comparação às que não engravidaram, afastando de vez o temor de que a gestação aumentaria o risco de recorrência da doença.
“Ao integrar soluções de oncologia de precisão e saúde reprodutiva, conseguimos apoiar médicos e pacientes em decisões rápidas e precisas. Isso significa olhar além do diagnóstico imediato, preservando não apenas a vida, mas também a qualidade de vida e os projetos futuros das mulheres”, afirma Maria Amorim, gerente de desenvolvimento de mercado para Sequenciamento Clínico da Thermo Fisher Scientific.
Durante o Outubro Rosa, mês dedicado à saúde feminina e à conscientização sobre o câncer de mama, o debate sobre oncofertilidade ganha ainda mais relevância. Mais do que vencer a doença, as mulheres podem hoje vislumbrar um futuro com qualidade de vida, em que o sonho da maternidade continua sendo possível graças à medicina personalizada e às novas tecnologias genéticas.